O Grupo de Trabalho (GT) sobre a reforma administrativa criado na Câmara dos Deputados já discute a possibilidade de demissão de servidores por insuficiência de desempenho, como parte de uma proposta que resgata o espírito da PEC 32/2020. Embora os articuladores da reforma tentem afastar a comparação com a proposta de Jair Bolsonaro, o conteúdo segue a mesma direção: flexibilização de vínculos, metas produtivistas e mais poder para demitir.
A ideia dos defensores da reforma é estabelecer uma Lei de Responsabilidade e Resultados, que torne obrigatória a definição de metas em toda nova política pública. Isso abriria caminho para avaliações constantes e punitivas, em nome da chamada meritocracia. O relator do GT, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), foi claro: “Isso significa mudar a lógica das políticas públicas com base na meritocracia”.
A proposta inclui também a regulamentação da demissão por fraco desempenho, prevista desde a reforma de 1998. A avaliação de desempenho — que já existe no setor público — passaria a ser usada como instrumento de desligamento, não mais como ferramenta de aprimoramento institucional. E isso sem qualquer compromisso com a garantia de condições de trabalho ou investimentos nas estruturas que sustentam o serviço público.
Eficiência para quem?
Apesar de afirmar que não se trata de uma reforma com foco em ajuste fiscal, o próprio Pedro Paulo admite o impacto: “Sou o mais liberal e fiscalista do Congresso. Mas esta não é uma reforma focada no ajuste fiscal, embora possa resultar em queda de gastos ao longo do tempo”. Fica claro que está tudo no mesmo pacote.
A suposta “modernização do Estado” carrega, na prática, uma lógica empresarial: impor metas, mensurar produtividade e premiar ou punir conforme resultados — ignorando que o serviço público não opera como empresa e que servidores não são peças substituíveis de uma engrenagem gerencial.
Nesse modelo, o risco é evidente: avaliar o servidor sem antes garantir estrutura, pessoal, equipamentos e formação permanente é institucionalizar o assédio moral como método de gestão.
O servidor como vilão: discurso reciclado, prática perversa
Embora o deputado diga que “a estabilidade não pode acabar, assim como não se pode reduzir os direitos do servidor” e que “olhá-lo como vilão e causador da ineficiência do Estado é um equívoco”, os eixos da proposta revelam o contrário. Ao tornar o desempenho individual critério para progressão e permanência no cargo, o projeto mina a estabilidade na prática, cria um ambiente de insegurança permanente e abre margem para perseguições políticas, ideológicas e institucionais.
Enquanto isso, temas centrais como a valorização das carreiras, o fortalecimento das estruturas públicas e o combate às desigualdades entre os servidores seguem fora da agenda prioritária do GT.
Supersalários: cortina de fumaça para atacar a base
O combate aos supersalários — especialmente os pagos no Judiciário e no Ministério Público — também aparece no discurso da reforma, mas não há garantias de que essas medidas serão enfrentadas com firmeza. O próprio Pedro Paulo reconheceu que “há uma imensa dificuldade de voto, porque na ‘hora do vamos ver’, há lobby, pressões”. Assim, o que se vende como ajuste para conter excessos pode se transformar, mais uma vez, em corte na base e proteção ao topo.
A falsa modernização esconde um projeto de desmonte
O mantra da modernização do Estado tem sido repetido como pretexto para retirar direitos, enfraquecer o serviço público e reconfigurar o papel do Estado segundo os interesses do mercado. A proposta de instituir demissões por desempenho, em vez de melhorar o serviço prestado à população, tende a aprofundar a precarização e o adoecimento dos servidores, além de fragilizar o acesso da população a políticas públicas essenciais.
Mobilização e vigilância permanentes
Com o relatório final do GT previsto para os próximos dias, o Sindsef-SP segue alertando que a reforma administrativa é prioridade da base do governo no Congresso. Ainda que haja resistências pontuais, o Executivo segue dialogando com parlamentares que atuam sob a lógica neoliberal.
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