Entenda o que está por trás do projeto de privatização da previdência

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Artigo lançado no site do Sintrajud explica, minuciosamente, o que está por trás do Funpresp. Ao aprovar o PLC 02/2012, o Governo Dilma joga a responsabilidade do Estado ao mercado financeiro. Confira!

Privatização da previdência está nas mãos de Dilma. Entenda o que está por trás desse projeto

Por Caê Batista

No segundo semestre de 2011, o governo Dilma colocou a criação do Funpresp – Fundo de Previdência Complementar do Servidor Público – como sendo um de seus principais objetivos.

No começo deste ano, chegou a afirmar que nenhum servidor seria contratado antes da aprovação do Fundo, que foi aprovado por unânimidade no Senado sob o número PLC 02/2012. Leia mais aqui.

Aprovado com relativa folga na Câmara, no final de fevereiro, e por unanimidade no Senado, no dia 28 de março, o projeto valerá para os trabalhadores que vierem a ingressar no serviço público após a sua aprovação. Porém, os atuais servidores poderão, caso queriam, poderão aderir ao fundo.

O governo já ensaia uma campanha para que os atuais trabalhadores venham aderir ao Funpresp.

Previdência dos trabalhadores públicos tende ao equilíbrio – Antes de tudo, é preciso dizer que a previdência dos servidores públicos tende ao equilíbrio. Em 2011, o Tesouro Nacional destinou para o pagamento de aposentadorias e pensões de servidores civis, militares de do Distrito Federal (DF) o montante de R$ 52 bilhões.

Destes, apenas R$ 28 bilhões, ou 55%, referem-se a 670 mil servidores civis federais, representando um custo médio de R$ 43,5 mil no ano.

O restante dos recursos, cerca de R$ 24 bilhões, ou 45% do total, referem-se a gastos com militares federais e servidores do DF que não contribuem para o Tesouro. “As médias de gasto com reformas e pensões de 285 mil militares federais e 41,7 mil servidores do DF atingiram, respectivamente, R$ 69,3 mil e R$ 81,85 mil no mesmo período”, afirma o estudo A verdade sobre a Previdência do Servidor Público Federal.

Desenvolvido por Lucieni Pereira, Auditora Federal de Controle Externo do Tribunal de Contas da União e diretora do Sindlegis, o estudo demonstra que em 2011 “a arrecadação das contribuições previdenciárias dos servidores cresceu 9,8% e a necessidade de aporte de recursos do Tesouro Nacional para pagamento das aposentadorias e pensões variou apenas 0,91% em relação a 2010, enquanto os gastos da União com os benefícios de servidores do DF cresceram 17,58%”.

Analisando o ano de 2011, a auditora aferiu que dos R$ 5,2 bilhões gastos com aposentadorias e pensões dos órgãos do Poder Judiciário e Ministérios Público da União, R$ 4,8 bilhões foram pagos com as próprias contribuições dos servidores e magistrados, além da contribuição da patronal.

“Para o pagamento de 24.886 aposentadorias e pensões do Judiciário da União e 2.103 do MPU o Tesouro Nacional aportou apenas R$ 345 milhões, o que representa 6,65% do total dos gastos que o Governo Federal denomina de ‘déficit da previdência’”, aponta o levantamento.

Desfinacialização da previdência – Com o Funpresp, o sistema previdenciário dos servidores públicos terá uma drástica redução em sua arrecadação. Isso porque hoje a contribuição patronal, feita pela União, é de 22% da remuneração limitada ao teto constitucional.

Pelas bases delineadas pelo PLC 02/2012 consolida-se uma política de corte muito perversa, em que a União reduz drasticamente o seu papel de ente patrocinador cortando a contribuição de 22% da remuneração bruta para 22% do teto do Regime Geral da Previdência Social. Caso o trabalhador venha a aderir ao Funpresp, o governo acrescentaria 8,5% da contribuição deste servidor além do teto do RGPS. (Este percentual ainda não está fechado. O governo ainda estuda a possibilidade de manter a sua contribuição em 7,5%)

Por exemplo, um servidor que ganha R$ 5 mil mensais contribui para a previdência com 11% da totalidade de sua remuneração, ou R$ 550. Por sua vez, a União contribui com 22%, ou R$ 1.100.

O limite dessa contribuição dos servidores é de R$ 2.939,54, teto remuneratório constitucional.

Com a mudança imposta pelo Funpresp, a contribuição do servidor será reduzida a 11% do teto do INSS, hoje em R$3.916.

Ou seja, a contribuição desse mesmo servidor que recebe R$ 5 mil cairia para R$ 430,16. A União continuaria contribuindo com 22%, porém também limitado ao teto do Regime Geral de Previdência, R$ 3.916,00, ou seja, R$ 861,52.

Caso o servidor venha a aderir ao Funpresp, a União contribuiria com 8,5% da contribuição do servidor. Se ele optar por aportar R$ 100,00 mensais, a União contribuiria com mais R$ 8,50 por mês.

Mais de 30 anos arrecadando – Serão 30 anos até que os novos servidores comecem a ter condições para aposentadoria. Assim, o fundo praticamente não terá retiradas, somente entradas de recursos. Recursos esses que serão administrados por uma entidade de caráter privado.

Neste período, entretanto, os recursos que sustentam a previdência dos servidores públicos passarão a ser cada vez mais escassos. Principalmente na medida em que mais trabalhadores públicos forem se aposentando e os novos forem sendo contratados sob este novo regime previdenciário. Essa situação poderá abrir espaço para que o governo apresente novas proposta de reformas previdenciárias.

A aposentadoria nas mãos do mercado financeiro – O fato é que os recursos para as futuras aposentadorias estarão entregues ao sabor dos mercados financeiros. Para se ter uma ideia dos riscos que envolvem essa questão basta ver as perdas que a Petros – Fundo de Pensão dos funcionários da Petrobras – teve nos últimos meses.

Segundo noticiou o jornal Valor Econômico dos dias 17, 17 e 18 de março, a Petros perdeu R$ 70 milhões com operações fraudulentas do banco Morada.

“Um dois maiores fundos de pensão do país, a Petros investia em papéis de alto risco lastreados em créditos podres emitidos pelos mesmos donos do Morada”, afirma a reportagem.

Diante do volume de recursos administrado pela Petros – R$ 55,6 bilhões -, a perda não foi tão grande. Mas quando se entende o que sucedeu para essa perda, qualquer um ficaria com muito receio de entregar a sua aposentadoria a operações como essas.

Segunda maior fundação de previdência do país, a Petros adquiriu títulos conhecidos como cédulas de crédito bancário (CCBs), que tinham como lastro operações de crédito consignado geradas pelo Morada e que haviam sido removidas do balanço do banco.

O Morada usava três empresas – Allcred, Secred e Morada SPE – para limpar seu balanço, mantendo o grau de inadimplência da carteira de crédito sob controle e reduzindo a necessidade de capital da instituição. O repasse de crédito do banco para as empresas foi mantido pelo banco de agosto de 2007 a março de 2009. Para quitar com o banco a compra desses créditos, as empresas emitiam as CCBs, que eram, por sua vez, vendidas a investidores. Os créditos ficaram sob guarda dessas empresas, que compraram os empréstimos sem coobrigação do banco. Ou seja, agora, o banco Morada não é responsável pelo pagamento das CCbs, que viraram pó.

Os créditos repassados às três empresas tinham alto grau de inadimplência. Boa parte deles recebia classificação “H”, a pior na escala do Banco Central, que obrigava o banco a fazer uma provisão de perdas equivalentes a 100% do valor dos empréstimos.

Pagamento da dívida pública e o Funpresp – Maria Lucia Fattorelli desenvolve um importante trabalho junto ao movimento Auditoria Cidadã da Dívida Pública. Uma organização que realiza estudos sobre o pagamento da dívida pública brasileira e execução orçamentárias, entre outros.

De acordo com os levantamentos de Fattorelli, nos últimos anos, aproximadamente 50% do Produto Interno Bruto (PIB) tem sido destinado ao pagamento da dívida pública brasileira, que engloba as dívidas interna e externa.

A segunda maior fatia do PIB é destinada ao sistema previdenciário, cerca de 22%. Todas as outras rubricas recebem percentuais muito pequenos do Produto. Para se ter uma ideia, o setor de habitação que foi um dos carros chefes da campanha presidencial de Dilma recebeu nos últimos anos menos de 0,004% do PIB. A educação não recebe sequer 3% e o orçamento da saúde não chega a 5% do PIB. Veja mais aqui.

De acordo com Fattorelli, o fato de ainda deter uma fatia considerável do PIB em relação a outros gastos da União explica o porquê da Previdência Social ser alvo de ferrenhos ataques por parte do setor financeiro, nacional e internacional. Esses ataques se manifestam nas reportagens e artigos publicados vastamente pelos maiores jornais e revistas do país. O mesmo acontece com as grandes emissoras de TV, principalmente a TV Globo, Record e Bandeirantes.

“O objetivo evidente… é apropriar-se dos recursos que ainda são destinados à Seguridade Social para destiná-los aos juros. Daí os falaciosos discursos “déficit da previdência, necessidade de novas reformas e privatização”, afirma no artigo Riscos do Projeto de Lei 1992/07, Face à Crise Financeira Mundial.

Para Fattorelli, o que está por trás do Funpresp, que privatiza a previdência dos trabalhadores públicos, é o interesse do mercado financeiro. Os recursos depositados durante mais de 30 anos pelos trabalhadores públicos serão “capitalizados”, ou seja, serão utilizados para comprar ações no mercado financeiro.

Esse mesmo mercado que levou a economia mundial ao colapso, que tem feito os trabalhadores em diversos países do mundo a enfrentar severos cortes em salários e direitos.

Há ainda quem argumente que o mercado financeiro pode apresentar bons resultados. Fattorelli rebate essa ideia: “No Brasil, a Resolução n° 26/08 do Conselho de Gestão de Previdência Complementar (CGPC), do Ministério da Previdência Social, determina que parte de eventuais superávits dos Fundos de Pensão sejam transferidos à entidade patrocinadora”.
Em março de 2010, uma resolução do Ministério da Previdência Social substituiu o CGPC pelo Conselho Nacional de Previdência Social (CNPC).

Previ, do Banco do Brasil, é um bom exemplo – No caso específico da Previ ( Caixa de Previdência dos funcionários do Banco do Brasil) –  que mantém o posto de maior fundo de pensão da América Latina, com patrimônio de US$ de 92 bilhões apurado no final de 2010 – “esta resolução já permitiu a apropriação de bilhões de reais  que deveriam ser destinados ás reservas garantidoras dos futuros aposentados”, afirma Fattorelli, destacando que pela lei de 9.530/1997, os lucros do BB distribuídos ao Governo Federal são obrigatoriamente destinados ao pagamento da dívida pública.

Estado sem nenhuma responsabilidade com a aposentadoria dos trabalhadores públicos

Em 2011, o Sintrajud promoveu um seminário sobre a Previdência Pública com um dos principais estudiosos do tema no país, o auditor fiscal da Floriano Martins.

Ele explicou que atualmente o Tesouro Nacional é responsável por arcar com qualquer déficit que venha a existir na previdência dos servidores públicos, uma vez que não há fundo próprio para a aposentadoria destes trabalhadores.

Segundo explicou, a lei a lei 9717/98 criou os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), determinando que os estados e municípios criassem seus regimes próprios de previdência. Mas que a União não criou o seu, e agora vem com a proposta de Previdência Complementar.

Ainda disse que existem três tipos de Regimes Próprios: o sem fundo, que é o atualmente aplicado aos servidores federais, onde o regime financeiro é orçamentário e o Estado é responsável pelo pagamento dos aposentados.

Há o fundo capitalizado, aplicado na maior parte dos municípios e estados, em que são criados dois fundos, um financeiro e outro previdenciário, “mas a responsabilidade continua sendo do Estado, caso haja déficit”.

E no terceiro, o Estado não assume qualquer responsabilidade sobre a aposentadoria. “É esse que está previsto no PL”, explicou. Floriano afirmou que a União está “pulando” do atual regime para um Regime Complementar que também compreende: fundo capitalizado, aplicação do teto do regime geral e contribuição definida.

A redução dos riscos e responsabilidades do Estado com a privatização da previdência estão destacados na cartilha que o Ministério da Previdência publicou sobre o Funpresp. Nela o governo afirma: “(O Funpresp) limita o risco atuarial ao limite do teto do RGPS, pois o benefício garantido pelos planos seria na modalidade de contribuição definida que tem BAIXO RISCO PARA O ESTADO”.

Assim, ao aprovar o Funpresp, o governo Dilma estará fazendo com que o Estado brasileiro abra mão de qualquer responsabilidade com as aposentadorias dos trabalhadores públicos, entregando ao mercado financeiro o destino de milhares de trabalhadores, que dedicaram os melhores anos de suas vidas ao serviço público.

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