II Seminário de negras e negros da CSP-Conlutas avança no combate ao racismo

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A CSP-Conlutas, com o apoio do Quilombo Raça e Classe, realizou um seminário com o objetivo de avançar no combate ao racismo. O tema do evento já apontava o caminho dos debates “Combatendo o racismo no cotidiano sindical, popular, estudantil e na sociedade com raça, gênero e classe”.

Segundo Júlio Condaque, membro da Executiva Nacional da CSP-Conlutas, a escolha do tema foi criteriosa, uma vez que os movimentos sociais não estão imunes ao “mito da democracia racial” e tampouco a “invisibilização” da história e das reais condições de vida de negras e negros em nosso país. “Reverter esta situação é uma tarefa muito importante, já que esta postura está profundamente enraizada na própria história do movimento operário, particularmente pela forte tradição que o populismo teve e também como consequência do stalinismo que, na prática, sempre se recusou a fazer um debate de raça e classe”.

“Qualquer projeto de transformação social em um país composto majoritariamente por negras e negros exige uma política concreta de inclusão e combate permanente ao racismo. Muitas vezes temos enormes dificuldades de identificação com os movimentos exatamente por não nos vermos na estrutura, composição e atuação das entidades. Este é um enorme obstáculo a ser superado”, comentou o ativista, que também é membro do Quilombo Raça e Classe.

A pauta do Seminário  

No total, foram realizados quatro painéis com os temas: “Não há capitalismo sem racismo”, “Conjuntura Nacional e Internacional”, “Como o racismo se expressa no mundo do trabalho e na sociedade” e “Combatendo o racismo no cotidiano sindical, popular, estudantil e na sociedade com raça, gênero e classe”. Foram realizados também cinco grupos de discussão temáticos: “Operários”, “Saúde e Previdência”, “Educação”, “Campo e Cidade” e “Sindicatos Públicos e Privados”. O evento foi encerrado com uma plenária que apresentou os debates dos grupos temáticos e um manifesto, chamado de “Carta do Rio de Janeiro”. 

O evento ocorreu no Rio de Janeiro, entre os dias 22 e 24 de abril. O Sindsef-SP, seguindo a tradição de lutar pelo combate as opressões participou com uma representaçao composta servidores, aposentados e da ativa, de órgãos como Ipen, Ex-LBA, MTE, Min.da Saúde, Mins. da Defesa e Ibama. 

Painel “Não há capitalismo sem racismo”  

O painel de abertura fez um importante resgate histórico ao frisar que na história da humanidade a escravidão nunca foi imposta a um povo tal como foi feita ao povo africano. E se existem desigualdades é porque apenas uma parcela da sociedade – hoje, a burguesia- continua rica sem trabalhar e se apropriando do que é produzido, controlando a produção e a distribuição de acordo com as suas necessidades de lucro. Enquanto a outra parcela é obrigada a se submeter em troca de um salário.  

Neste sentido, é sempre necessário lembrar, como já defendeu Malcolm X, que “não há capitalismo sem racismo”.  Mesmo ciente de que o racismo não foi uma criação do sistema capitalista, Malcolm X, corretamente, identificou que a ideologia racista cumpre um papel fundamental dentro da lógica do sistema vigente.  

Além da desigualdade, a sociedade capitalista também cria hierarquias no interior da própria classe trabalhadora. E o racismo contra a população negra é necessário para reforçar isso. Ao inferiorizar essa parcela da classe, a burguesia aprofunda diferenças e nos explora ainda mais através de menores salários, corte de direitos, e impede acesso aos serviços públicos básicos como saneamento, transporte, saúde e educação.  

Painel “Conjuntura Nacional e Internacional”   

Neste painel foi evidenciado como até os indicadores do governo mostram o quanto é perigoso ser negro no Brasil. O Mapa da Violência, elaborado pelo próprio governo do PT, mostra que ser jovem negro no país significa ter 132% de chance a mais de morrer de forma violenta do que ser jovem não negro. Por trás dos números se esconde uma verdadeira política de genocídio da população negra da classe trabalhadora.  

Para os palestrantes, o genocídio da população negra nos bairros pobres das grandes cidades confirma que a situação dos negros, em essência, não mudou após quatorze anos de governo petista. Lula e Dilma privilegiaram o agronegócio, baseada em grandes propriedades agrícolas de brancos. Na outra extremidade social, pode-se ver a cor negra dos operários agrícolas e dos sem terras e a luta dos quilombolas.  

As medidas do governo, ao lado de seus aliados da direita, atacaram a população negra, como a não titulação de terras quilombolas e indígenas, os cortes no orçamento da educação e da saúde, além da redução de gastos com programas sociais.  

Também destacaram o aumento da violência contra a juventude negra e contra a mulher, a falta de recursos para aplicação da Lei 10.639/2003 – que obriga o ensino da história da África e da escravidão no Brasil nas escolas –, bem como a destinação de quase 50% do orçamento público para pagamento de banqueiros mostram de que lado a Dilma está. Para piorar, o governo Dilma manteve a ocupação militar no Haiti para reprimir os haitianos. Não há nenhum interesse em erradicar o racismo. Por isso, o povo negro não tem nenhum interesse em defender esse governo. “O PT afrontou o movimento negro e nós, negros, já não temos nenhuma justificativa plausível para defender Dilma, a não ser como cúmplice do seu racismo estrutural”, afirmou Hertz Dias, membro do Quilombo Raça e Classe, no encerramento do debate.  

A luta dos quilombolas do Movimento Moquibom também foi destaque. O movimento, recentemente filiado à CSP-Conlutas ocupou a sede estadual do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) no Maranhão contestando os relatórios técnicos que dividem territórios beneficiando fazendeiros, além Eles denunciam também os assassinatos que estão ocorrendo nas comunidades.  

Hertz denunciou ainda que a presidente Dilma, ao entregar o Ministério da Agricultura à Kátia Abreu (PMDB), deixou claro de que lado está. “Para o governo, as vidas quilombolas nada valem. Dados da Comissão Pastoral da Terra revelaram que de 1985 a 2014 houve 144 casos de assassinatos no campo somente no Maranhão. Até hoje nenhum mandante foi condenado”, afirmou o dirigente.  

 

Painel “Como o racismo se expressa no mundo do trabalho e na sociedade”  

Esse debate abordou que a luta contra o racismo, de imediato, deve se voltar contra três males que afetam a população negra: as desigualdades no mercado de trabalho, a exclusão do processo educacional e a violência racial.  

Os palestrantes deste painel evidenciaram que o racismo impede a entrada de negros e negras no mercado de trabalho, dificulta sua ascensão e promoção profissional e impõe critérios de remuneração diferenciada. Mostraram, por exemplo, como a questão da “boa aparência”, muito cobrada das mulheres, deve ser combatida, pois via de regra, exclui as negras de seleções e entrevistas de emprego ou as obriga a alisar os cabelos para atender a um padrão “embranquecedor”.  

A população negra recebe salário 36,11% menor do que os brancos no país. Os negros ainda tem maior instabilidade no trabalho e buscam emprego por mais tempo que os brancos, além de ocupar postos de trabalho mais precários e vulneráveis. “É mais comum ver o negro no chão de fábrica ou em postos de trabalho de base da produção e com uma jornada de trabalho maior do que os não negros” ressaltou Rosália Fernandes, uma das participantes do painel.  

As mulheres negras são duplamente vítimas de discriminação, por gênero e raça, e ocupam um lugar ainda mais precário no mercado de trabalho. O salário médio da trabalhadora negra continua sendo a metade do salário da trabalhadora branca. Mulheres negras têm um índice maior de desemprego em qualquer lugar do país. A taxa de desemprego das jovens negras chega a 25%. Uma entre quatro jovens está desempregada e estão em maior número nos empregos mais precários e informais, cerca de 71% contra 54% das mulheres brancas e 48% dos homens brancos. Os rendimentos das mulheres negras em comparação com os homens brancos nas mesmas faixas de escolaridade não ultrapassam os 53%.  

Na educação, a discriminação racial pode ser constatada em todos os níveis: do total desprezo aos milhões de mulheres negras e pobres que não têm creches para seus filhos à ínfima parcela de negros e negras que chega às salas de aula das universidades. A política de cotas raciais foi colocada como uma medida paliativa no combate aos efeitos do racismo na educação, sempre colocada na perspectiva de inserir a luta por ações afirmativas em todos os setores da sociedade e pela destruição do sistema que se beneficia do racismo.   Os palestrantes também destacaram a criminalização da pobreza, em particular contra os negros pobres, com repressão indiscriminada nos bairros populares e o quanto essa lógica se une com a criminalização dos movimentos sociais. A repressão às lideranças, sindicatos e entidades do movimento popular e estudantil à frente das mobilizações é parte também da resposta do Estado contra a população.    

Painel “Combatendo o racismo no cotidiano sindical, popular, estudantil e na sociedade com raça, gênero e classe”    

Outro ponto alto do encontro foi a realização deste painel, onde veio à luz o debate sobre a opressão machista, homofóbica e racista às mulheres negras. “Identificar as diferentes formas das expressões de racismo contra as mulheres é fundamental para entender que, para além da luta implacável contra o machismo, os movimentos sindical, popular e estudantil devem elaborar um programa específico para as mulheres negras que, perante a exploração capitalista, são ainda mais exploradas e agredidas pelo racismo”, definiu Maristela Farias – do Movimento Quilombo Raça e Classe.  

Para Joaninha de Oliveira, membro da Executiva Nacional da CSP-Conlutas, negar nossas desigualdades no campo político, econômico ou social, não ajuda a avançarmos no combate ao racismo. “Para a CSP-Conlutas, o caminho é inverso, é necessária a compreensão que existem diferenças e que brancos possuem privilégios que negros não possuem, que poderemos avançar, de fato, colocando, lado a lado, brancos e negros da classe trabalhadora no combate ao racismo. Esconder realidades tão diferentes só facilita à burguesia difundir sua ideia de que estamos todos em pé de igualdade de condições. E acaba por aprofundar o racismo, por não percebermos o protagonismo que os negros tiveram em sua resistência e na formação do nosso país”, declarou.  

 

“Carta-Proposta referendada pelo II Seminário de Negras e Negros da CSP-Conlutas  

O II Seminário de Negras e Negros da CSP-Conlutas acontece em meio a uma forte crise econômica estrutural do capitalismo em escala mundial que, por um lado, recrudesce o racismo, mas, por outro,  intensifica a resistência dos trabalhadores e dos povos oprimidos em todo o mundo, e especialmente no Brasil, país mais negro fora do continente africano. A luta dos trabalhadores ocorrem de maneira brilhante, impondo derrotas e mais derrotas ao imperialismo, apesar das direções traidoras. A África retorna ao cenário político como há muito tempo não víamos.  Da Nigéria, passando pela Tunísia até a África do Sul, os trabalhadores têm protagonizado levantes e mais levantes como o dos mineiros em unidade com a juventude negra da cidade de Marikana, na África do Sul. São enfretamentos que incorporam à luta de classe os seus elementos raciais mais explosivos. Neste mesmo país as rupturas de massa com COSATU e o CNA mostram os limites do empoderamento individual. As rebeliões negras em Ferguson e Baltimore nos Estados Unidos obedecem a essa mesma dinâmica. Seguindo nessa mesma direção, os nossos irmãos haitianos encabeçam mais uma insurreição contra um processo eleitoral fraudulento. No Brasil vivemos uma crise econômica combinada a uma grave crise política sem solução em curto prazo e a entrada em cena de vários setores da classe trabalhadores e da juventude em luta. Em todos esses processos as mulheres negras, LGBTs e a juventude negra das periferias dos grandes centros urbanos aparecem como vanguarda. Independente dos desdobramentos políticos em torno do impeachment da presidente Dilma, as lutas tendem ao acirramento. Fenômenos políticos como o Junho de 2013, as manifestações contra o genocídio negro, as rebeliões do Comperj, a Ocupação Preta da USP, os “rolezinhos”, as ocupação de escolas públicas que se espalham por várias capitais do país, a resistência indígena e quilombola com a retomada dos seus territórios históricos são expressão da enorme contribuição que o povo negro está dando ao processo de reorganização dos trabalhadores no país. Diante disto, os negros e negras da CSP-Conlutas estão dando um passo adiante nos debates e nas elaborações políticas para melhor preparar nossas entidades e os quadros no sentido de sua localização e intervenção nesse rico processo que se abre. Estivemos aqui no Rio de Janeiro em três dias de debates e troca de experiências focados nessa tarefa e acreditamos que fomos vitoriosos. Saímos daqui certos de que a nossa central pode cumprir um papel estratégico para dar unidade a essas lutas negras que estão em andamento e incorporá-las as lutas mais gerais da classe trabalhadora. E essa possibilidade histórica só está colocada efetivamente para nós porque foi um grande acerto fundarmos uma central que abriga em seu interior entidades sindicais, movimentos estudantis e da juventude, além dos movimentos negros e populares do campo e da cidade. Mas, é preciso avançar.  A CSP-Conlutas precisa ousar mais perante suas entidades filiadas em relação ao tema racial e de todas as demais formas de opressão. Sabemos que isso não se dá por decreto, mas é preciso sensibilizar as direções dos nossos sindicatos para que implementem as resoluções sobre os temas que foram aprovadas no I Encontro Nacional de Negras e Negros da CSP-Conlutas e no II Congresso Nacional. Com base nas discussões que viemos acumulando, concluímos que nossas organizações não estão imunes a reproduzir ideologias e práticas preconceituosas e racistas em seu interior. Quem perde é a classe trabalhadores que se divide. O mito da democracia racial acaba naturalizando essas práticas. É tarefa fundamental levar a cabo uma luta implacável contra as opressões tanto por dentro como por fora das entidades. Isso certamente nos dará mais autoridade e confiança política para disputar a reorganização em negras e negros.”  

Fonte: www.csp-conlutas.org.br

 

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