Março agrega mais uma data importante no calendário de lutas

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A partir de 2023, no dia 21 de março, passa a ser celebrado o Dia Nacional das Tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, instituído pela Lei 14.519/2023.

A celebração é um passo importante no combate ao racismo religioso e ao mesmo tempo é uma homenagem aos ancestrais do povo negro, reconhecendo e valorizando as diversas lutas de resistência elaboradas para manter viva as manifestações religiosas africanas, neste território para onde foram trazidos à força.

Para justificar a crueldade da escravização, de forma deliberada, os europeus buscaram desumanizar e/ou coisificar os negros, enquanto infligiam terríveis torturas físicas e psicológicas. Tudo feito sem peso na consciência e com o apoio da igreja e do Estado.

Como parte desse processo, os negros eram obrigados a se converterem ao catolicismo e abandonarem sua fé e tradições religiosas, pois não passariam de magia, superstição, idolatria, bruxaria.

Sheila Danzen, servidora do Ipen e diretora do Sindsef-SP, resgata que “os quilombos foram berço de muitas casas de Candomblé e Umbanda e que hoje cada casa dessa é um quilombo. Onde o negro tem orgulho de suas tradições. É um espaço de resistência e luta!”

Racismo religioso

Durante o 27° Congresso do Sindsef-SP, na mesa de combate às opressões, Wilson Honório, historiador, professor e membro do Quilombo Raça e Classe, comentou que há anos é obrigatório dar aula de História da África, mas que já foi “demonizado” na por abordar temas como candomblé, axé e orixás. “Tive amigos que perderam as aulas, pois as escolas simplesmente encerravam o programa” ou ainda “que não passavam na aula teste por citar iorubá” contou.

Nos dias atuais, também não faltam exemplos de casos de racismo religioso: A mãe de uma criança de um colégio particular, em Salvador, escreveu diversos ataques às religiões afro-brasileiras num exemplar do livro infantil Amoras, do rapper Emicida, que passou de mão em mão na sala de aula. Nas páginas que tratam dos orixás, ela acusou o autor de disseminar “blasfêmia” e “ideologia” de “religiões anticristãs”.

Três participantes brancos do programa Big Brother Brasil, da TV Globo, ficaram aterrorizados com o colega negro Fred Nicácio, por um deles acreditar ter visto o médico, que é candomblecista, rezar. Um deles avisou que abandonaria o reality show caso Nicácio insistisse nas rezas.

Esses relatos expressam o racismo religioso. Discurso ancorado em ataques aqueles seguem a umbanda, o candomblé, o culto de Ifá ou qualquer outra religião afro-brasileira.

Não são raros os casos de terreiros fechados e até reduzidos a cinzas por incêndios criminosos, ou de pessoas insultadas e atacadas na rua, pela hostilidade da vizinhança, ou expulsas de favelas pelo fuzil dos narcotraficantes ou milicianos.

Da mesma forma que inúmeras outras religiões, incluindo a católica, as umbandas e os candomblés acreditam em Deus, são monoteístas, pregam o amor, defendem valores morais e sociais, contam com orações, cânticos, danças e oferendas e têm sacerdotes que vestem roupas especiais e celebram cultos.

Infelizmente, em pleno século 21, os iniciados em religiões de matriz africana ainda sofrem com o preconceito e lutam contra a tentativa de apagamento das suas raízes.

As denúncias de desrespeito e ataques à religião de matriz africana no Brasil aumentaram 106% em apenas um ano, passando de 583, em 2021, para 1,2 mil, em 2022, uma média de três por dia. O estado recordista foi São Paulo (270 denúncias), seguido por Rio de Janeiro (219), Bahia (172), Minas Gerais (94) e Rio Grande do Sul (51).

No entanto, existe uma subnotificação dos casos de racismo religioso, uma vez que as polícias nem sempre registram os ataques sob essa tipificação.

Culto matriarcal

Cabe destacar que, embora tenham inúmeras características africanas, a umbanda e o candomblé não existem no continente africano.

Os cultos na África são patriarcais, tendo como líderes Babalaôs. No Brasil, o culto tornou-se matriarcal, com Ialorixás ou mães de santo à frente do conhecimento (somente em meados do século XX surgiram os primeiros Babalorixás ou pais de santo, mas até hoje a maioria das casas de Ilê axé são liderada por mulheres e em algumas ainda, a tradição diz que só mulheres poderão ocupar tal cargo). Foi através do pulso forte destas mães que se constituiu o candomblé brasileiro, preservando as tradições africanas.

Dedicar um dia a exaltar as tradições das Raízes de Matrizes Africanas e Nações do Candomblé, não é o que vai mudar o comportamento da sociedade, mas é um importante avanço para uma educação antirracista, baseada no respeito às diferenças, a liberdade religiosa e na expectativa de que as crenças e rituais do povo negro deixem de ser exploradas de forma negativa.

Para Ana Maria, servidora do Ipen, “esta lei vem amenizar a dor de quem se vê invadido, desrespeitado na mais pura ordem de fé e intimidade com seu orixá. O que poderia ser um ato nobre de entrega e promissão é desvirtuado na maldade, no preconceito e total desrespeito com as tradições do povo afrodescendente” comenta.

“Este foi um passo forte, um ato de boa fé e comprometimento do Estado, que tem o dever de garantir a liberdade religiosa e segurança a quem pratica. Não basta bradarmos por tolerância religiosa! Nós da Umbanda, do Candomblé precisamos é de Respeito”, conclui.

A data será compartilhada no calendário de lutas contra opressão, com o Dia Internacional de Combate à Discriminação Racial, estabelecido pela ONU, ambos celebrados em 21 de março.

Fonte: Agência Senado, PSTU, AEDASMG, G1

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